segunda-feira, janeiro 26, 2009

adeus avestruz

And if I seem to be afraid
To live the life that I have made in song
It's just that I've been losing so long.
La la la la la, la la.
(these days, nico)




Não agüentava mais ler nas páginas dos livros a vida que deveria ter tido e nunca aconteceu. Era um desperdício tanta expectativa. Deveria fechar o apartamento repleto de livros e ir pra o rio das ostras abrir um bar e viver de pescar peixes. Abrir os livros por prazer, sem desejos de respostas. Sumir do mapa, aposentar o telefone. Não ter numero.

O ponto alto de sua vida no último ano foi ficar sem celular por dois meses. Não poder ser achada. Odiava telefone.

Não agüentava mais ouvir nos acordes das músicas a vida que deveria ter tido e nunca aconteceu. Era um desperdício tanta expectativa. Deveria se dedicar às aulas de violão e às revistas de banca de jornal que ensinam mal como tocar a legião urbana, e assim assimilar as três posições necessárias para fazer sua própria música. Diferente de tudo e foda-se se os outros iriam achar igual. Rimar amor com dor, amor com flor, amor com impossibilidade de ser feliz. Cantar no karaokê disputando um nove e meio eletrônico com os bêbados de pinga e fossa.

O ponto alto de sua vida no último ano foi passar incólume, sem se interessar por ninguém. Desejava o mundo, e nada mais além disso.

Não agüentava mais assistir nas seqüências de planos dos filmes a vida que deveria ter tido e nunca aconteceu. Deveria desistir dessa história de imaginar casos impossíveis com astros made in usa que povoavam os seus sonhos. Era melhor ir para rua e gritar pela carioca. Fingir que sua loucura é performática e com sorte ganhar uns trocados para pegar o metrô de volta. Não ter mais medo. Despedir-se da era dos desperdícios. Fingir que agora era para valer.

O ponto alto de sua vida no último ano foram as horas no trânsito obrigando-a a observar. Os olhares tristes e exaustos dos solitários presos num ônibus lotado são sempre cheios de vida e medo.


Barbara Kahane

2 comentários:

Unknown disse...

Gostei muito da emoção do texto, tem quê de existencialismo na era da globalização. Espero que você desenvolva por que isso pode tornar-se um conto ou mesmo um romnace. Traduz toda a inutilidade e futilidade de uma época. Espero que a história não pare por aí !

Mariana Kaufman disse...

hahahaha - f-o-d-a-!

e mendes campos e marias e outros amados servem ao menos para sabermos dar palavras aos olhos que nos acompanham ruas a fora...!

mas alem dos livros, filmes e discos, temos os blogs e talvez neles encontremos a saida... ou então, nas meras festinhas de aniversário que, parecendo coisa boba, quem sabe não nos lembrm de algum caminho...

: )

sempre fã...